Os vetos aos Projetos de Lei nº 46/2025 e nº 80/2025 revelam um padrão preocupante: a repetição de propostas com apelo popular, mas sem sustentação técnica ou jurídica, que resultam em desgaste político e desperdício do trabalho legislativo.
O primeiro veto, ao PL 46/2025, de autoria do vereador Sidnei Prestes (Mobiliza), atingiu a proposta que previa sessões de cinema adaptadas para pessoas com hipersensibilidade sensorial, como autistas e pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
A intenção era nobre — promover acessibilidade e inclusão cultural —, mas o texto acabou barrado por vício de iniciativa, invasão de competência do Executivo e afronta ao princípio da livre iniciativa.
De acordo com o parecer da Procuradoria-Geral do Município, o projeto impunha obrigações diretas a empresas privadas, como ajustes de som, iluminação e publicidade, além de prever penalidades como multa e suspensão de alvará. Para o Executivo, essa interferência configurou ingerência indevida na atividade econômica e violação ao artigo 170 da Constituição Federal.
Além disso, ao definir medidas de execução e fiscalização, o projeto avançou sobre atribuições exclusivas do Executivo, contrariando o princípio da separação dos poderes. O governo municipal destacou ainda que as políticas de acessibilidade já estão amparadas por legislações federais, como a Lei Berenice Piana (Lei nº 12.764/2012) e a Lei nº 10.098/2000, que tratam do direito à integração social de pessoas com deficiência.
O segundo veto, ao PL 80/2025, tinha como objetivo tornar públicas as listas de espera por consultas, exames e cirurgias na rede municipal de saúde. O texto, de autoria da vereadora Valentina Rocha (PT), determinava a divulgação semanal dessas informações em portais eletrônicos e murais físicos.
Mais uma vez, o discurso de transparência não resistiu à análise técnica. O projeto foi considerado inconstitucional, por interferir na gestão administrativa da Secretaria Municipal de Saúde, além de violar a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Segundo o veto, a proposta invadia a competência exclusiva do Executivo ao impor procedimentos internos e obrigações de atualização de sistemas. Pior: ao prever a divulgação de iniciais e números do Cartão Nacional de Saúde, o texto criava risco de reidentificação e exposição de dados sensíveis de pacientes.
A prefeitura lembrou ainda que já existem ferramentas que cumprem a mesma função — como o aplicativo Saúde Cidadã Foz, o portal e-FOZ “Posição Fila SUS” e o sistema RP Saúde —, permitindo aos usuários acompanhar suas posições nas filas de forma segura e individualizada.
Os dois vetos evidenciam um problema estrutural na produção legislativa municipal: a falta de técnica e assessoramento jurídico qualificado. Projetos de apelo popular, embora bem-intencionados, acabam esbarrando em limitações legais básicas, como o respeito à separação dos poderes e às competências constitucionais de cada esfera.
Na prática, essas falhas transformam boas ideias em textos ineficazes e juridicamente inviáveis — e reforçam a imagem de um Legislativo mais voltado ao simbolismo do que à efetividade.
O prefeito Joaquim Silva e Luna, ao justificar ambos os vetos, reconheceu o mérito das intenções e reafirmou o compromisso do Executivo com políticas de inclusão, acessibilidade e transparência. Contudo, ressaltou que essas ações precisam respeitar os limites legais e administrativos estabelecidos.
Os casos dos PLs 46 e 80 de 2025 mostram que boa vontade política não substitui técnica legislativa. Em tempos de demandas crescentes por transparência e inclusão, elaborar leis com base sólida e constitucional é mais do que uma formalidade: é condição essencial para transformar ideias em políticas públicas reais.
			

















































