Hoje divido com vocês um trecho do livro A Águia e a Galinha, de Leonardo Boff, uma excelente metáfora da condição humana, que fala sobre nossas polaridades, sobre quem – essencialmente – somos. O livro de Boff traz como título o de uma fábula, escrita por James Aggrey, um educador popular de Gana, um pequeno país da África Ocidental.
James escreveu a fábula em um momento histórico de seu país, por volta de 1925, momento em que era preciso encorajar as pessoas a buscarem por suas liberdades. Boff adaptou o texto, em seu livro, dando ao original um toque mais voltado para a condição humana. Ambos escritores falam sobre a importância de sabermos quem, verdadeiramente, somos quando livres de amarras limitantes, sejam elas físicas ou psíquicas.
A Águia e a Galinha
“Era uma vez um camponês que foi à floresta vizinha apanhar um pássaro para mantê-lo cativo em sua casa. Conseguiu pegar um filhote de águia. Colocou-o no galinheiro junto com as galinhas. Cresceu como uma galinha. Comia milho e ração própria para galinhas. Embora a águia fosse o rei/rainha de todos os pássaros.
Depois de cinco anos, este homem recebeu em sua casa a visita de um naturalista.
Enquanto passeavam pelo jardim, disse o naturalista:
– Esse pássaro aí não é galinha. É uma águia.
– De fato, disse o camponês. É águia. Mas eu a criei como galinha. Ela não é mais uma águia. Transformou-se em galinha como as outras, apesar das asas de quase três metros de extensão.
– Não, retrucou o naturalista.
Ela é e será sempre uma águia. Pois tem um coração de águia.
Este coração a fará um dia voar às alturas.
– Não, não, insistiu o camponês. Ela virou galinha e jamais voará como águia.
Então decidiram fazer uma prova.
O naturalista tomou a águia, ergueu-a bem alto e desafiando-a disse:
– Já que você de fato é uma águia, já que você pertence ao céu e não à terra, então abra suas asas e voe!
A águia pousou sobre o braço estendido do naturalista.
Olhava distraidamente ao redor. Viu as galinhas lá embaixo, ciscando grãos. E pulou para junto delas.
O camponês comentou:
– Eu lhe disse, ela virou uma simples galinha!
– Não, tornou a insistir o naturalista. Ela é uma águia. E uma águia será sempre uma águia.
Vamos experimentar novamente amanhã.
No dia seguinte, o naturalista subiu com a águia no teto da casa. Sussurrou-lhe:
-Águia, já que você é uma águia, abra suas asas e voe!
Mas quando a águia viu lá embaixo as galinhas, ciscando o chão, pulou e foi para junto delas.
O camponês sorriu e voltou à carga:
– Eu lhe havia dito, ela virou galinha!
– Não, respondeu firmemente o naturalista. Ela é águia, possuirá sempre um coração de águia.
Vamos experimentar ainda uma última vez.
Amanhã a farei voar.
No dia seguinte, o naturalista e o camponês levantaram bem cedo. Pegaram a águia, levaram-na para fora da cidade, longe das casas dos homens, no alto de uma montanha.
O sol nascente dourava os picos das montanhas.
O naturalista ergueu a águia para o alto e ordenou-lhe:
– Águia, já que você é uma águia, já que você pertence ao céu e não à terra, abra suas asas e voe!
A águia olhou ao redor. Tremia como se experimentasse nova vida. Mas não voou.
Então, o naturalista segurou-a firmemente, bem na direção do sol, para que seus olhos pudessem encher-se da claridade solar e da vastidão do horizonte.
Nesse momento, a ave abriu suas potentes asas, grasnou com o típico kau-kau das águias e ergueu-se, soberana, sobre si mesma. E começou a voar, a voar para o alto, a voar cada vez para mais alto.
Voou… voou… até confundir-se com o azul do firmamento…”
Que possamos, em algum momento, encontrar o nosso Sol! Nos reconhecer!
Que despertemos para o nosso melhor, para a nossa identidade mais pura, com corações gratos e conscientes de que há desafios, mas há, também, superações.
A vida já nos foi dada, basta saber se estamos dispostos a vivê-la plenamente!
Até o próximo porto!
Com afeto,
Estella Parisotto Lucas