Quando cai a noite alguns espaços públicos se tornam dormitórios daqueles que não têm teto. São marquises de prédios públicos e particulares, localizados em corredores turísticos, ruas de comércio, equipamentos de uso comunitário. Nos semáforos, não raro, os motoristas são abordados por mendigos ou vendedores de balas e outras miudezas.
Na entrada do Ministério do Trabalho, localizado na Avenida Jorge Schimelpfeng, tradicional reduto gastronômico de turistas e iguaçuenses, cerca de 15 pessoas se juntam para passar a noite ou apenas aguardar a doação de alimentos.
Moradores de rua que não possuem teto há 20 anos dividem espaço com mulheres e crianças (bebês de colo) que, apesar de terem moradia, permanecem no local a espera da doação de alimentos. “O CRAS não fornece cestas básicas para quem não tem criança pequena, mas eu não posso trabalhar, sou doente e não consigo me aposentar. Então venho aqui para conseguir comida”, explicou Maria Corina.
Já sua vizinha, Rosanete Simão, traz a netinha que fica sob seus cuidados para esperar pelas doações. Segundo ela a cesta do CRAS não é suficiente para toda família.
O irmão de Rosanete, vive na rua há muitos anos e passa a noite ali porque, segundo ele, é mais seguro e tem sempre quem dá dinheiro, comida ou cigarro.
Outro presente no local, que atende pelo nome de Jhon, disse que faltam vagas nos abrigos e que no Centro Pop não é possível dormir, apenas almoçar. “Faz muitos anos que está assim. Agora, sofremos com a pressão que a prefeitura faz para que empresários não doem alimentos”, denunciou.
“O pessoal da umbanda não deixa de doar, toda semana eles estão aqui”. Contou o rapaz, articulado, com aparência asseada e cabelos bem penteados. Por fim ele desabafou: “São tantas coisas que acontecem na rua que precisaria de muito tempo para explicar e dizer como gostaríamos que fosse”.
O local escolhido pelos moradores de rua, além de lhes dar visibilidade, ainda se justifica pela existência, no governo anterior, da geladeira solidária, que ficava em frente à sede da Secretaria de Assistência Social e foi desativada. Na geladeira muitas pessoas deixavam alimentos para alimentar essa população de rua.
Se naquele corredor turístico os sem teto são bastante amistosos, o mesmo não acontece com os ocupantes do espaço próximo ao Terminal de Transporte Urbano (TTU). Bem na frente do TTU, um casal fumando craque e que não quis falar com a reportagem.
No terreno vazio na esquina das avenidas JK com a República Argentina, um ambiente montado na parte interna da grade que protege a área. Móveis que visivelmente foram descartados, imagens de santos e outros apetrechos domésticos, indicando que aquele local é utilizado por alguém, em algum momento do seu dia ou noite.
Ao longo da JK, maltrapilhos revolvendo sacos de lixo que os comerciantes e moradores deixam sobre a calçada e outras dezenas de moradores de rua abrigados em frente aos prédios comerciais que não estão sendo utilizados. Alguns acompanhados de crianças e cães de estimação. Outros com carrinho de coleta de recicláveis. Em comum, todos carecendo de dignidade e atenção do poder público.
Secretaria de Assistência Social
Procurada para se posicionar sobre o assunto a Secretaria de Assistência Social enviou a seguinte nota:
A Secretaria Municipal de Assistência Social, por meio deste comunicado, vem expor a organização e os avanços nos atendimentos à população em situação de rua, destacando o compromisso com a Política Nacional de Assistência Social (PNAS), o Plano Nacional Ruas Visíveis e a ADPF 976, que orientam as ações e diretrizes para a promoção de direitos e a garantia de dignidade a essa população.
De acordo com essas políticas e decisões judiciais, a Secretaria tem desenvolvido diversas ações voltadas para o acolhimento, a reintegração social e a promoção da dignidade da população em situação de rua.
As principais iniciativas incluem:
Serviço Especializado de Abordagem Social (SEAS): A equipe do SEAS atua 24 horas por dia, sete dias por semana, realizando abordagens nas ruas da cidade com o objetivo de identificar e acolher pessoas em situação de rua, encaminhando-as para os serviços de acolhimento e apoio psicossocial.
Centro de Referência Especializado para Atendimento à População em Situação de Rua – Centro POP: Este centro oferece atendimento contínuo, das 7h às 19h, sete dias por semana, proporcionando suporte, acolhimento e atendimento psicossocial à população em situação de rua.
Serviço de Acolhimento
Casa de Passagem: A SMAS oferece 140 vagas distribuídas em três unidades de casas de passagem, garantindo atendimento humanizado e eficaz, conforme as diretrizes do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). O acolhimento é provisório e visa garantir a privacidade e segurança das pessoas atendidas, com respeito à diversidade de gênero, religião, etnia e orientação sexual.
As casas de passagem estão localizadas conforme segue:
Casa de Passagem I
Local: Rua Henrique Alberto Pepin, nº 378, Jardim São Paulo
Público-alvo: Famílias, Mulheres e Idosos
Vagas: 50
Contato: 2105-9545 / 99957-8811
Casa de Passagem II
Local: Rua Ângela Aparecida Andrade, nº 199, Porto Belo
Público-alvo: Adultos do gênero masculino (18 a 59 anos)
Vagas: 30
Contato: 99976-0186 / 3521-9562
Casa de Passagem III (Lar Esperança)
Local: Rua Estanislau Ponte Preta, nº 264, Jardim Ana Cristina
Público-alvo: Adultos do gênero masculino (18 a 59 anos), com prioridade para migrantes
Vagas: 60
Contato: 3031-3495
O Município de Foz do Iguaçu tem se dedicado ao fortalecimento de políticas intersetoriais para garantir a segurança pessoal e a proteção dos bens das pessoas em situação de rua nos abrigos institucionais.
A colaboração constante das Secretarias de Saúde e Segurança Pública tem sido essencial para a implementação de medidas eficazes de proteção.
Plano de Acolhimento de Inverno de 2025:
Melhorias e Avanços no Atendimento à População em Situação de Rua
O Plano de Acolhimento de Inverno de 2025 tem como objetivo fundamental proporcionar um ambiente seguro, digno e acolhedor para a população em situação de rua, especialmente durante os períodos de temperaturas extremas, visando minimizar os riscos à saúde e promover o acesso a direitos básicos, tais como alimentação, abrigo e encaminhamentos para reintegração social e mercado de trabalho.
Entre as ações adotadas, destacam-se as melhorias e adequações nas infraestruturas dos abrigos, com a criação de áreas de convivência organizadas e dormitórios que asseguram tanto a proteção quanto a privacidade dos acolhidos. Tais medidas visam proporcionar um ambiente seguro e saudável, onde os indivíduos se sintam protegidos e respeitados.
Além disso, o plano prevê a ampliação das vagas de acolhimento para pessoas em situação de rua. Para o ano de 2025, com base na previsão de queda das temperaturas, o município antecipou a organização do acolhimento, iniciando as atividades no dia 1º de maio de 2025, antes do pico do frio. Este plano, que já disponibilizava 140 vagas fixas, passou a contar com a abertura de mais 40 vagas temporárias, oferecendo um total de 180 vagas de acolhimentos e pernoites. O principal objetivo desse esforço é garantir que a população em situação de rua tenha acesso a um local seguro durante as noites de frio intenso, minimizando a exposição a condições climáticas adversas e os riscos à saúde.
É relevante destacar que as equipes envolvidas no plano têm desempenhado um trabalho árduo e resiliente na busca por atendimento e encaminhamentos para essa população vulnerável. Embora o número de vagas de acolhimento não tenha sido atingido em sua capacidade máxima, as vagas estão sempre à disposição. A atuação das equipes tem sido eficaz, refletindo, inclusive, em um aumento significativo de 70% no atendimento nas ruas durante o período de 2025, em comparação com o mesmo período de 2024. Esse resultado é reflexo de uma organização eficiente e do esforço contínuo das equipes alocadas para o atendimento da população em situação de rua.
É importante frisar que a política pública que baliza esse plano está alicerçada em diversas normativas e decisões judiciais, como a ADPF 976 do Supremo Tribunal Federal (STF), que determina a responsabilidade do Estado em assegurar a dignidade da pessoa humana, principalmente em situações de vulnerabilidade extrema.
Importante ressaltar que, conforme as diretrizes legais e a natureza dos serviços prestados, não existem quaisquer formas de condução coercitiva ou obrigatória para o acolhimento.
A participação nos serviços é sempre voluntária, sendo oferecido à população em situação de rua o direito de escolha quanto à aceitação ou recusa do acolhimento.
Nesse contexto, o serviço tem sido prestado de forma responsável e comprometida, respeitando os direitos da população atendida.
No entanto, cabe ressaltar que, durante os 15 primeiros dias do mês de maio de 2025, de acordo com levantamento realizado pelas equipes de atendimento, mais de 179 pessoas em situação de rua optaram por recusar qualquer tipo de acolhimento ou atendimento oferecido. Esse dado evidencia, mais uma vez, a complexidade do processo de inclusão social dessa população, que, por diversas razões, pode não estar disposta a aceitar os serviços disponíveis, mesmo em um contexto de risco à saúde e segurança.