‘Fora’ da Rio-2016, hóquei brasileiro agoniza e tenta cartada final

A cada dia que 2016 se aproxima, a comunidade de um esporte aumenta a sua agonia. As promessas em torno do hóquei sobre a grama no Brasil em 2007, quando o país sediou o Pan-Americano, viraram pó em um misto de acusações de má gestão, falta de estrutura e amadorismo. A um ano e meio dos Jogos Olímpicos, as Seleções masculina e feminina não têm perspectivas de competir em casa.

Em razão do baixo nível técnico das equipes, a Federação Internacional de Hóquei (FIH) impôs uma condição para o Brasil participar do evento. Aos homens, a presença no top-30 do ranking mundial. Às mulheres, pelo menos o 40º lugar. Eles estão em 32º. Elas, em 42º.

Tão perto, mas ao mesmo tempo tão longe. Apenas eles têm chances de atingir a meta. Classificada para o Pan de Toronto, entre 10 e 26 de julho, a Seleção precisa terminar pelo menos em sexto para subir na lista. Um feito pouco provável, considerando-se o retrospecto contra os rivais pan-americanos, como Argentina, Chile e México. Mas possível.

No feminino, a última chance foi a Liga Mundial de 2014. Mas a Confederação Brasileira de Hóquei Sobre Grama e Indoor (CBHG) não mandou a equipe, alegando falta de recursos. Segundo as jogadoras, o time acabou. Todo o dinheiro que a entidade recebe via Lei Agnelo/Piva (em 2014, o valor foi de R$ 1,7 milhão) é hoje destinado à equipe masculina, comandada por Cláudio Rocha, filho do presidente da CBHG, Sidney Rocha. Para piorar, a goleira Inge Vermeulen se suicidou no último dia 12.

– Desistiram cedo demais da gente. Por mais que não conseguíssemos a pontuação, poderíamos ganhar um convite. Estamos revoltadas. Não há base no país. Se pararmos de jogar, o hóquei desaparece – disse a zagueira Alessandra Flores.

Um grupo de atletas, com apoio das federações paulista e catarinense, fala em ir à Justiça tentar derrubar a atual gestão do esporte, que conta com um único campo oficial no país, no Rio de Janeiro. Uma Assembleia Geral está prevista para sexta-feira, em Florianópolis.

Procurado pelo L!Net, Sidney não quis se pronunciar. A CBHG, em nota oficial, afirmou que “não reconhece como válida a Assembleia Geral Extraordinária” pelo fato de as federações em questão “não estarem em dia com suas obrigações perante o Estatuto” e não terem direito a voto.

Além da ajuda do COB, uma proposta de convênio da CBHG com o Ministério do Esporte foi aprovada em 2014, no valor de R$ 4.975.975,63. A assessoria do órgão informou que o dinheiro foi pago no último dia 21 de janeiro.

Contas no vermelho e uso de receitas geram críticas
Para as jogadoras, o argumento da falta de recursos não se sustenta devido aos valores que a CBHG recebe anualmente. Uma consulta ao balanço financeiro da entidade referente ao ano de 2013 mostra que foram recolhidos R$ 2.076.985,09 por meio da Lei Agnelo/Piva, além de R$ 123.303,97 pelo programa Solidariedade Olímpica do Comitê Olímpico Internacional (COI). Os dados de 2014 ainda não foram divulgados.

O saldo em dezembro daquele ano, no entanto, é de R$ 6.105,14 negativos. O mesmo valor é correspondente a “despesas administrativas”, não detalhadas. Em 2012, o custos dessa categoria chegaram a R$ 31.891,49.

Balanço da CBHG de 2013 não especifica gastos (Foto: Reprodução/Site Oficial CBHG)

Há ainda outro questionamento no que diz respeito à verba recebida do COB. De 2012 para 2013, o valor aplicado no desenvolvimento do esporte sofreu uma queda de R$ 170.945,25 para R$ 77.873,72.

– A CBHG corta verba do desenvolvimento do esporte e diz que era para preparar as Seleções. Pois bem, a feminina nunca teve uma preparação que passasse de 20 dias – critica a atleta Nathália Marques.

Em 2015, a CBHG receberá R$ 1.904.000,00 via Lei Agnelo/Piva.

Atletas reclamam que CBHG corta recursos para desenvolvimento do esporte (Foto: Reprodução)

COB justifica concentração de investimentos

A decisão de concentrar os investimentos na equipe masculina tem o aval do Comitê Olímpico do Brasil (COB). Embora as jogadoras neguem que haja uma diferença de nível significativa entre as equipes, a entidade afirma que realizou mais de seis reuniões presenciais com a Federação Internacional de Hóquei sobre a Grama e a CBHG antes de tomar a decisão.

“Apesar desses esforços, e dos investimentos feitos em 2014 (R$ 1,7 milhão) e ao longo dos últimos anos (entre Lei Agnelo/Piva e Solidariedade Olímpica Internacional) no hóquei sobre a grama, a seleção feminina não conseguiu atingir um nível técnico mínimo para participar dos Jogos Olímpicos em 2016. Esta foi a conclusão da própria Federação Internacional de Hóquei Sobre a Grama. Diante disso, o COB, com a concordância da Federação Internacional e da Confederação Brasileira, optou por concentrar os investimentos na seleção masculina, que tem um nível de jogo mais próximo da qualidade técnica exigida pelos Jogos Olímpicos em 2016. O COB continuará trabalhando junto à Confederação Brasileira de Hóquei sobre a Grama para que a modalidade se desenvolva e atinja um nível técnico capaz de qualificar o país para os Jogos Olímpicos Tóquio 2020 e assim por diante”, disse o Comitê em nota enviada ao L!Net.

Em todas as edições do Campeonato Sul-Americano até hoje, a Seleção feminina nunca ultrapassou a quarta colocação. Os homens já conquistaram uma medalha de bronze, em 2013.

BATE-BOLA

Lisandra Souza

Goleira do Brasil no Pan-2007

‘Não há mais uma Seleção feminina’

Qual o motivo da insatisfação das jogadoras com a CBHG?

Eles vêm privilegiando o masculino há alguns anos. Não temos nada contra a equipe deles, mas ficamos de lado. Sendo que é um esporte que precisa de crescimento. E as crianças que querem jogar? O que será delas?

Concorda que a equipe masculina é melhor que a feminina?

É complicado falar. Nossos adversários são superiores aos da masculina. Como exemplo, a Argentina. É segunda do ranking mundial no feminino. Só agora o país entrou no top-10 no masculino.

O que a CBHG disse a vocês?

Falam como se fosse um corte. Mas todas sabemos que é difícil voltar. Não tem técnico, comissão. Não existe mais seleção feminina.
Quanto você já pagou do bolso para competir no Brasileiro?
R$ 2 mil. Nós pagamos transporte e alojamento. Alimentação eles dão.

Fonte: Lance!Net

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